Uma divergência na metodologia utilizada pelo Tesouro Nacional e pelo Banco Central para calcular receitas e despesas do governo resultou em uma "discrepância estatística acima do normal para o mês de setembro", de acordo com a instituição responsável pela política monetária.
A diferença de R$ 28,1 bilhões entre os resultados é a maior já registrada desde o início das séries históricas em 2002. Até então, a maior diferença havia sido um pouco acima de R$ 8 bilhões, em janeiro de 2017.
Essa discrepância nos resultados, em meio a discussões do governo sobre a flexibilização da meta fiscal, não é bem vista pelo mercado, destaca o relatório divulgado pelo Inter na quarta-feira (8).
"Em meio à dificuldade do ajuste fiscal e às declarações do governo sobre a flexibilização da meta fiscal para o próximo ano, isso pode ser interpretado como um sinal do Banco Central de que não apoiará medidas que possam ser vistas como tentativas de mascarar o resultado fiscal", afirmou a instituição.
O resultado apresentado pelo BC difere do apresentado pelo Tesouro porque o governo incorpora em seus cálculos R$ 26 bilhões em recursos do PIS/Pasep que não foram reclamados por um período superior a 20 anos.
Enquanto o Tesouro considerou esse valor como receita primária, o BC o classificou como ajuste patrimonial, seguindo a metodologia adotada pela instituição desde 1991.
"Trata-se, neste caso, de uma operação que não resultou de uma transação econômica comum entre o setor público e o setor privado, vinculada, por exemplo, ao pagamento de tributos, e, portanto, não se assemelha ao recebimento regular de receitas públicas", explicou o BC em comunicado.
Para Murilo Viana, especialista em contas públicas, a diferença entre os resultados reflete mais uma discrepância na forma como as duas instituições operam, algo incomum em países desenvolvidos onde os Bancos Centrais geralmente não desempenham um papel central na contabilização das estimativas das contas públicas.
"Há um debate no Brasil que atribui esse papel pouco comum do BC a uma herança do período de alta inflação, o que é atípico em relação a outros Bancos Centrais de países desenvolvidos", ressaltou Viana.